Naquela zona montanhosa do Séles, havia muito minério, principalmente ferro, e as trovoadas eram horríveis, sempre a cair faíscas. Numa noite houve um grande temporal com muitos trovões, e de manhã os serventes vieram chamar o meu pai, para ir ver um "sekúlo" (na língua portuguesa quer dizer muito velho), que fez a sua cubata aproveitando uma árvore velha.

Ele estava sentado a fumar o seu cachimbo ao lado da fogueira e com a cabeça encostada no tronco da árvore. Caiu uma faísca na árvore, rachou-a ao meio e o "sekúlo", conforme estava, assim ficou. Morto, com o cachimbo na boca.

Das muitas histórias que minha mãe me contava, recordo-me de uma em que o meu pai relembrando a sua viagem de Portugal para Angola, lhe disse que o navio em que viajava aportou em Cabo-Verde, na ilha de São Vicente. Ele e os rapazes seus companheiros de viagem, foram visitar a ilha e resolveram sentar-se a tomar umas bebidas. Entraram no único hotel que lá havia, sentaram-se a uma mesa e veio uma empregadita servi-los.

Eles, como hábito da rapaziada jovem, foram dizendo graças para ela, e quando a moça lhes apresentou a conta, eles com ar de gozo, disseram que não pagavam. A empregada foi lá dentro chamar a patroa. Apareceu uma senhora alta, muito direita, com cara de poucos amigos, e disse: "Quem é que não quer pagar a conta?".

Meu pai e os companheiros muito atrapalhados, puxaram das carteiras e pagaram, pedindo desculpas e dizendo que só estavam a brincar com a menina. Essa senhora, dona do hotel, como é o destino... era a tia de minha mãe, Emília ou Elisa, não tenho a certeza.

Meu querido pai, nas suas viagens de serviço para Teixeira de Sousa, passava no Luacano, onde tinha um grande amigo, o senhor Periquito, que tinha casa comercial no lago Dilolo, chana da Cameia. Na fotografia, o meu pai de passagem pelo lago, está em cima de uma canoa.

rmão Francisco, nossa Mãe, Mimi, Nina e Zeca


Também me lembro duma história, esta contada pelo meu pai, devia eu ter entre 9 e 10 anos, passada na mata que rodeava a casa no Seles. Um dia, à tarde, meu pai saiu para caçar, com a ideia de apanhar uma cabra ou outra peça de caça miúda, para arranjar carne para casa. Ia muito distraído, de espingarda às costas e a certa altura, ao chegar ao alto de um pequeno morro, olhou em frente e a poucos metros, em vez duma cabra, viu um leão que estava deitado debaixo duma árvore e que o fixava com olhar fixo, talvez também surpreendido. Dizia meu pai que ficou paralisado, sem saber o que havia de fazer. Começou a recuar devagarinho e quando já não via o leão, apressou o passo e voltou para casa, não ganhando para o susto.



Continuando a falar de meus pais, venderam a casa comercial de Vila Nova de Seles, e foram para Quingenge, uma terra no Distrito da Ganda, onde meu Pai se estabeleceu novamente como comerciante, associando-se a dois senhores.



Compraram mais duas casas comerciais no mato, ficando o meu pai na sede e os sócios, cada um na sua filial. A vida foi passando, e no ano de 1922, no dia 9 de Agosto, nasceu outro filho, a que deram o nome de António.



A 7 de Outubro de 1925, nasceu mais um bébé, desta vez uma menina, a quem deram o nome de Maria Isabel. Em casa era conhecida por Lili. A 9 de Abril de 1928, nasceu o quarto filho, mais um rapaz, a quem deram o nome de Armando.

Eles cresceram e o Francisco, o António e a Lili andavam na escola. Gostavam muito de ir caçar passarinhos com a fisga. A Lili era muito malandra e "Maria rapaz", gostando de andar com os irmãos, mas minha mãe muitas vezes não a deixava ir, pondo-a a bordar. Os irmãos ficavam muito tristes, pois adoravam levar a Lili com eles, e pediam à mãe para a deixar ir. Minha mãe não gostava que ela fosse, porque era uma menina e então marcava-lhe tarefas na toalha que ela estava a bordar, pois em Angola era assim, começávamos de muito pequenas a fazer o nosso enxoval, e então minha mãe dizia-lhe: só vais se acabares o bordado demarcado. Pensava ela que a Lili não conseguia acabar, e a minha mãe ia para o seu trabalho, descansada.

Pouco tempo depois, vinham os três todos contentes dizer que a tarefa estava acabada, e que assim, já podiam ir. Minha mãe não tinha coragem de dizer que não, pois tinha prometido, e o bordadinho estava perfeito. Um dia mais tarde, eles confessaram à mãe, que o Francisco é que ajudava a Lili a bordar.

Eles não gostavam muito de andar com o Armando, que era mais novo, muito mimado, e contava aos pais tudo o que os manos faziam. Um dia eles estavam entretidos num cantinho do quintal, a fazer cigarrinhos com folhas secas que enrolavam em papel, e punham-se a fumar. O Armando era pequenino, viu, e à noite estando o meu pai sentado a descansar, tirou do bolso a carteirinha de papel para fazer o seu cigarro, pois antigamente era assim que os homens faziam, colocavam o tabaco na mortalha e enrolavam fazendo o cigarro.

Meu pai começou a fumar, e o Armando pôs-se a choramingar e a dizer: "eu também quero...". Meu pai muito zangado disse-lhe que não, que os meninos não fumavam. O Armando disse logo "os manos também fumam"

O que ele foi dizer, meu pai quis saber se ele estava a dizer a verdade, e o Francisco, o António e a Lili, não tiveram outro remédio que confessar e ganharam uma tareia. Ficaram com raiva e chamaram o Armando de "ranhoso".

Armando numa tourada de brincadeira em Silva Porto, a levar uma cornada do touro e a ser levantado ao ar